A intensa mobilização da comunidade científica para derrubar os vetos ao novo Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação (Lei n° 13.243/2016) não surtiu o efeito esperado na noite desta terça-feira (24). Em sessão tumultuada por questões políticas e pela discussão em torno da votação da nova meta fiscal de 2016, o Congresso Nacional decidiu manter os vetos e o texto permanece da mesma forma quando sancionado pela presidente afastada Dilma Roussef.
A decisão do Congresso, no entanto, foi dividida. Na Câmara dos Deputados, os vetos foram derrubados com ampla maioria, por 276 votos contra 2. Tal placar fez surgir um sentimento de ansiedade na comunidade científica que aspirava ter de volta o texto aprovado pelo Senado Federal.
O entendimento de especialistas do setor era que tudo caminhava pela derrubada, uma vez que a proposta do novo marco havia sido aprovada por votação quase unânime no Senado, em 2015. Por isso quando a decisão da Casa saiu, a profunda tristeza acometeu o grupo de atores do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI), que desde cedo mobilizava parlamentares em prol da derrubada dos vetos. Era preciso 41 votos – maioria simples – para o retorno dos dispositivos. No entanto, o número não foi alcançado.
Isenções
Os dispositivos vetados permitiam, entre outras medidas, isentar de contribuição social para a Previdência Social as bolsas concedidas em projetos de pesquisa a alunos de instituições científicas, tecnológicas e de inovação (ICTs) privadas ou nas áreas de ensino, pesquisa e extensão em educação e formação de recursos humanos.
Outro ponto reprimido foi a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), do Imposto de Importação e do Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) sobre importações de máquinas, equipamentos, aparelhos e instrumentos destinados à pesquisa científica, tecnológica e de inovação.
Também foi vetado o artigo que permitia dispensa de licitação para contratar microempresas e empresas de pequeno e médio porte para prestação de serviços ou fornecimento de bens elaborados com aplicação sistemática de conhecimentos científicos e tecnológicos se houver um contrato de cooperação celebrada com a contratante. De acordo com o governo federal, essa dispensa apenas se justifica em caráter bastante excepcional, e da forma como foi redigido, os elementos para caracterizar a excepcionalidade ficaram excessivamente amplos.
Retrospectiva
O texto é fruto de um amplo debate com a sociedade civil e teve consenso entre as casas do legislativo durante a tramitação. Ele atende reivindicações antigas da comunidade científica para melhorar a inserção de empresas e instituições privadas de pesquisa nas iniciativas públicas, além de simplificar compras, importações e contratações realizadas dentro dos projetos de pesquisa. A legislação foi pensada para simplificar e tornar mais dinâmico o desenvolvimento científico, a pesquisa, a capacitação científica e tecnológica e a inovação no país.
Em 11 de janeiro deste ano, a presidente Dilma sancionou com vetos o novo Marco Legal da CTI, sob a justificativa que falta previsão orçamentária para corte de despesas ou aumento de receita. Dos oitos dispositivos rejeitados, cinco foram feitos na proposta de aperfeiçoamento e ampliação dos benefícios da Lei de Inovação (10.973/2004), a primeira legislação brasileira criada para regular as atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) no País. Conheça os vetos neste link.
Os vetos foram recebidos com estranhamento pela comunidade científica. Após anos de negociações em prol de um texto que houvesse amplo acordo entre governo e oposição, era esperado a sanção sem restrições. Somente no dia da sanção do novo marco que foi revelado a opção do governo. Desde então, representantes dacomunidade científica e tecnológica se mobilizaram em diversas reuniões com parlamentares, com o objetivo de traçar estratégia para derrubada dos vetos. Como foi evidenciado pelo deputado Sibá Machado, que foi relator do Projeto de Lei n° 2177/2011, que deu origem ao marco legal, mais uma vez deputados e senadores entram em acordo e devolveram os dispositivos ao texto.
“A Câmara dos Deputados produziu um documento que é o suprassumo da esperança de toda a categoria dos cientistas do nosso país, e o Senado não modificou o texto. Participaram conosco mais de 60 entidades dos estados de toda a União, das empresas brasileiras, das universidades, institutos particulares e públicos de pesquisa. Ou seja, não faltou ninguém”, afirmou Sibá Machado durante a votação.
A comunidade científica reprovou especialmente os vetos que impossibilitaram a não taxação de impostos previdenciários sobre o valor das bolsas pagas por instituições científicas e tecnológicas públicas; a isenção das importações feitas por empresas para atender projetos de P&D; a autonomia gerencial, orçamentária e financeira das ICTs públicas que exercem atividades de produção e serviços; e o que dispensa de licitação para contratar micro, pequenas e médias empresas para prestar serviços ou fornecer bens elaborados com aplicação de conhecimento científico e tecnológico.
Fonte: Leandro Duarte e Leandro Cipriano, da Agência Gestão CTI