Santa Catarina terá recursos da ordem de R$ 5 milhões, sendo que destes a Fapesc deverá contribuir com R$ 2,5 milhões. Participam com recursos financeiros a Embrapa, Capes, CNPq e 18 Fundações Estaduais de Apoio à Pesquisa, aportando a quantia de R$ 51.762.000,00 para todo o Brasil. O edital está no site www.cnpq.br.
A iniciativa do edital decorreu da percepção de que o incentivo e apoio à formação de redes de pesquisas são pertinentes para a indução ao desenvolvimento em áreas estratégicas e específicas, trazendo ainda o fortalecimento da capacidade instalada nas instituições de ensino e pesquisa, seu intercâmbio e ganhos sistêmicos e sinérgicos.
O doutor em agronomia Zenório Piana, diretor de pesquisa agropecuária e meio ambiente da Fapesc, participou de reunião em Brasília no mês passado, junto com outros cientistas da área das ciências agrárias, na discussão do documento básico do Repensa.
O tema sustentabilidade passa a fazer parte do cotidiano das empresas e de toda a sociedade e a vida no planeta passa por várias razões pela sustentabilidade da produção agrícola global. Como o Brasil tornou-se um protagonista de papel destacado na revolução tecnológica que se fez no campo nas últimas décadas e por ocupar a posição de terceiro maior exportador de produtos agrícolas do mundo, fomentar pesquisas que venham a gerar conhecimento, tecnologia e inovação para garantir a sustentabilidade do setor agropecuário, é uma questão estratégica para o país.
A agricultura é considerada a maior invenção do homem, pois o salvou da extinção e tem contribuindo para a sobrevivência e evolução da espécie, permitindo assim as grandes transformações da civilização humana. Esta é uma criação tão nobre e grandiosa que ainda não terminou e continua em constante evolução. Ao longo de sua história de mais de 10 mil anos, tornou-se também a mais importante atividade econômica do planeta, movimentando cerca de US$ 1,64 trilhão por ano, mas devido a grande diversidade de sistemas de produção e vasta extensão e intensificação, tornou-se causadora de grandes mudanças nos ambientes próximos e em escala global.
A maneira de explorar o potencial das plantas, dos animais, dos microrganismos e os demais recursos naturais, ou seja, de produzir, tem experimentado grandes revoluções nos últimos tempos. Essas mudanças tiveram origem na inteligência natural do homem e, após a revolução científica, passaram a ser fundamentadas nos avanços da Ciência. Com o tempo, a agricultura deixou sua natureza extrativista e passou a incorporar os conhecimentos de vanguarda das diversas áreas, tornando-se uma atividade moderna e de base tecnológica e intensiva em capital financeiro e intelectual que tem como plataforma fundamental o conjunto dos recursos naturais do planeta como solo, água, clima e biodiversidade, cujo valor monetário dos serviços ambientais que prestam é estimado atualmente em US$ 45 trilhões por ano. O solo, terras cultivadas, e as reservas de água doce representam mais da metade deste grande capital natural da humanidade.
Historicamente a agricultura evoluiu de sistemas de subsistência à chamada agricultura convencional de alto insumo dos anos 90, a qual fundamentou-se nas estratégias da Revolução Verde dos anos 70, mas que com a crise energética mundial e a conscientização ambiental, evoluiu para sistemas que contemplam o uso mais eficiente de insumos – dentre os quais a terra é o principal deles – objetivando não somente a produção, mas também a sustentabilidade.
A agricultura do século XXI caracteriza-se pela ampla aplicação de conhecimentos disciplinares, porém incorporados a conceitos de produção com finalidades específicas, integração multidisciplinar e visão sistêmica e com forte ênfase tecnológica, o que tem garantido seu papel na produção de alimentos e matérias-prima diversas demandadas pela crescente população do planeta, e assim refutando até o presente as profecias catastróficas de Thomas Malthus feitas no século XVIII. Mesmo com a redução das terras agricultáveis causada pelo aumento populacional, degradação do solo e restrição ao uso, a produção agrícola mundial tem sido crescente e suficiente para atender a demanda, graças ao desenvolvimento e adoção de novas tecnologias inovadoras aplicadas ao campo.
O processo de incorporação de tecnologias avançadas na agricultura não é fácil, devido a aspectos sócio-culturais, diversidade de sistemas de cultivos, ambientes e finalidades da produção. De fato, de acordo com Theodor W. Shultz, Prêmio Nobel de Economia de 1979, “é menos difícil adquirir e modernizar siderúrgicas e companhias aéreas do que modernizar a
agricultura”, mas ainda assim, ela tem evoluído muito, incorporando o que há de mais avançado da Biologia e Engenharia Genética, das Engenharias e Ciências Computacionais, das Ciências da Terra, Tecnologia da Informação e da Administração de Negócios, transformando-se em uma atividade bem fundamentada em conhecimento. Entretanto, para o avanço tecnológico continuado de modo a atender a demanda crescente, a agricultura enfrenta diversos desafios, alguns dos quais são destacados a seguir:
a) insuficiência de terras produtivas e água para atender a expansão necessária;
b) dependência de insumos e energia:
c) contribuição econômica e social;
d) produzir e conservar a natureza;
e) pressões por produtos agrícolas.
O Brasil pela sua situação privilegiada de disponibilidade de terras, água, clima, mão-de-obra e também pela tecnologia e gestão da cadeia do agronegócio, tem vantagens competitivas “tradicionais”. O país produz e exporta, principalmente, commodities agrícolas para mais de 180 países, mas tem grande dependência em recursos genéticos, especialmente cultivares geneticamente modificados e melhorados no exterior e de insumos manufaturados, tecnologias de máquinas e equipamentos. O país apresenta vulnerabilidades em setores que podem comprometer sua performance e representar ameaças para o futuro, como a alta dependência externa dos fertilizantes e também dos defensivos para as lavouras e medicamentos para a produção zootécnica.
Para mudar este quadro e passar a ter de fato vantagens competitivas, precisa de visão crítica e estratégica da questão e dispor de tecnologias e ferramentas de gestão para uma produção inovadora e eficiente, voltada também para o desenvolvimento de novos produtos com valores diferenciados para alcançar novos mercados. Com tecnologias modernas, recursos humanos competentes para a pesquisa, produção e negócios que garantam tecnologias de vanguarda para a produção limpa, segura e de qualidade, caminhamos para ter de fato vantagens competitivas e avançarmos em direção à sustentabilidade que passou a ser palavra de ordem advinda da crescente preocupação da sociedade com os problemas ambientais a qual culminou nos anos 80 com um novo paradigma para a sociedade: a sustentabilidade em seus níveis econômico, ambiental e social.
O setor agrícola enfrenta dificuldades em manter a estratégia da primeira geração da Revolução Verde iniciada no Brasil nos anos 70, deflagraram-se discussões entre produtores, pesquisadores e a sociedade como um todo, manifestando grande preocupação com o futuro. Isto evolui para a idéia de sustentabilidade tornando-se um tema de destaque na Rio-92, com vista à formulação da Agenda 21 Brasileira,
na qual Agricultura Sustentável e Gestão de Recursos Naturais constituíram-se nos principais eixos temáticos. Existem várias definições para a “Agricultura Sustentável”, mas todas traduzem a visão da manutenção do nível de produção em máxima harmonia com os recursos naturais e demais componentes e atores do sistema produtor e consumidor. Para ser sustentável, a produção precisa ser: eficiente, lucrativa, conservadora e protetora do ambiente e dos recursos naturais; sadia e segura, realizada com ética, responsabilidade e equidade social. Mais recentemente, incorporou-se uma abordagem mais ampla contextualizada como desenvolvimento
sócio-ambiental que se aplica a todos os setores da atividade econômica, não ficando restrito à agricultura.
Como a discussão sobre sustentabilidade originou-se de dissidentes da chamada agricultura moderna, o foco inicial da pesquisa era direcionado para a incorporação dos conhecimentos e fundamentos da agroecologia e campos das ciências sociais, tendo como foco a oposição às tecnologias modernas (uso de agroquímicos, mecanização intensiva, melhoramento vegetal e irrigação) e ênfase em políticas públicas e medidas fiscais punitivas às práticas insustentáveis.
Embora sempre procurada, “Produção Sustentável” não é fácil de ser definida e muito menos de ser atingida, pela sua complexidade e multiplicidade de componentes e atores, mas deve-se sempre buscar o máximo de sustentabilidade. Seus fundamentos harmonizam os limites da ecologia, da ciência da produção animal e vegetal e das ciências sociais, por isso, sistemas sustentáveis de produção devem preconizar o uso racional dos recursos naturais; proteger a biosfera, o solo, recursos hídricos e a biodiversidade; produzir com segurança e qualidade, além de obedecer a padrões éticos, estéticos e de equidade social.
A biodiversidade agrícola, também conhecida por agrobiodiversidade, inclui todos os componentes da diversidade biológica que constituem o agroecossistema e são relevantes para alimentação e agricultura como a variedade e a variabilidade de animais, plantas e microorganismos, no nível genético, de espécie e de ecossistema, que são necessárias para manter funções chave do agroecossistema, sua estrutura e processos. Assim, as seguintes dimensões da biodiversidade agrícola podem ser identificadas:
a) recursos genéticos para alimentação e agricultura;
b) componentes da biodiversidade agrícola que provêm serviços ecológicos (ambientais).
A biodiversidade, em seu sentido amplo, apresenta forte interação com a agropecuária e estreita relação e interdependência com a produção e sustentabilidade dos agrossistemas.
Há no Brasil inúmeros casos de sistemas com alta sustentabilidade agrícola, graças ao desenvolvimento e adoção de práticas conservadoras do solo, água e nutrientes, mas estes sistemas necessitam de constantes avanços tecnológicos.
Os critérios de definição e parametrização dos limites técnicos e ambientais dos indicadores de sustentabilidade da produção precisam ser desenvolvidos para os principais sistemas de cultivos nas condições brasileiras.
Além disso, considerando a ênfase atual do discurso sobre sustentabilidade do planeta, as atividades agrícolas podem se tornar também meios de mitigação dos impactos ambientais que tem conseqüências para o aquecimento da Terra colocando a questão da sustentabilidade em uma dimensão inédita, a da sustentabilidade sócio-ambiental da atividade agropecuária. Isto mais uma vez coloca o Brasil em posição de destaque, considerando que desenvolvemos a agricultura mais “verde” do Planeta, ao mesmo tempo em que oferecemos oportunidades menos onerosas para a redução de emissões dos gases do efeito estufa. Podemos desenvolver e implementar processos produtivos mais eficientes e com economia de CO2 e seqüestro de carbono no solo, através do plantio direto e no ecossistema através do reflorestamento de áreas degradadas ou impróprias para a agricultura. Um conjunto de ações com foco para estas questões cria novas oportunidades a partir de ameaças
A adoção de meta de redução de emissão de GEE em 36,1% a 38,9% até 2020, já anunciado por autoridades brasileiras, terá grande impacto no setor agropecuário que necessitará de inteligência e inovação para se adequar a estas novas regras sem prejudicar a produção. A redução prevista reduzirá em 176 milhões de toneladas de CO2, e o governo acaba de lançar um plano de investimento de R$ 2,0 bilhões para o estímulo a Agricultura de Baixo Carbono (ABC). Dispomos de inteligência e competência para tornar nossa agropecuária ainda mais sustentável e assim entrar em uma nova era: a de produzir alimentos em quantidade e qualidade e com visão sócio-ambiental.
É notório que mobilizemos e organizemos nossa competência para continuarmos avançando na sustentabilidade da agropecuária nacional.
Os objetivos específicos do Edital Repensa são:
– Organizar e integrar as ações de C,T&I em agrobiodiversidade e sustentabilidade da
agropecuária por meio de redes de estudos e de pesquisa, de abrangência nacional, que mobilize de modo convergente a inteligência, competência e a política das instituições públicas federais e estaduais e demais organizações e empresas que atuam nas cadeias do agronegócio brasileiro;
– Estimular e fomentar de forma mais articulada e consolidada pesquisas sobre o estado de conhecimento e as ameaças e oportunidades para o avanço continuado da agropecuária nacional frente aos desafios presentes e futuros, tendo como foco central a agrobiodiversidade e sustentabilidade da produção agropecuária;
– Estimular a revitalização do Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária com ênfase
especial às OEPAS, promovendo a integração entre pesquisadores e equipes das diversas instituições públicas e empresas para as ações de pesquisa e inovação em sustentabilidade;
– Contribuir para a geração de base de dados e informações, definição de indicadores,
índices e padrões realistas de sustentabilidade agronômica, zootécnica e análise de
conformidade técnica e socioambiental da agropecuária nacional;
– Contribuir para incorporar visão crítica e sistêmica e avaliação da situação e status de sustentabilidade dos sistemas de produção brasileiros.
Texto extraído do documento básico do Edital Repensa.
Mais informações com o Diretor de Pesquisa Agropecuária e Meio Ambiente da Fapesc, Dr. Zenório Piana, e-mail: piana@fapesc.sc.gov.br; telefone: (48) 3215-1212.